Mensagem

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Blog de José Luís Mendonça

José Luís Mendonça é jornalista, escritor e docente universitário. Fundou e dirigiu durante sete anos o jornal CULTURA, quinzenário angolano de Artes & Letras. Actualmente reparte a sua vida pública entre o jornalismo, o ensino e o activismo cultural pelo fomento do livro e da leitura. MENSAGEM é uma homenagem ao primeiro movimento cultural surgido em Angola nos últimos 50 anos, o Movimento dos Novos Intelectuais de Angola, cujo lema "Vamos Descobrir Angola!" operaria uma revolução decisiva na sociedade colonial dos fins da década de 40. Mensagem é o nome da revista desse movimento onde estiveram concentrados os expoentes máximos da intelectualidade daquela época, que jogou um papel decisivo perante a História de Angola. Ester blog recupera do passado esse legado e essa designação da Mensagem, na crença de que, ao descobrir Angola, também se vai reencontrando a África e descobrindo o Mundo e o Universo.

Blog de José Luís Mendonça

José Luís Mendonça é jornalista, escritor e docente universitário. Fundou e dirigiu durante sete anos o jornal CULTURA, quinzenário angolano de Artes & Letras. Actualmente reparte a sua vida pública entre o jornalismo, o ensino e o activismo cultural pelo fomento do livro e da leitura. MENSAGEM é uma homenagem ao primeiro movimento cultural surgido em Angola nos últimos 50 anos, o Movimento dos Novos Intelectuais de Angola, cujo lema "Vamos Descobrir Angola!" operaria uma revolução decisiva na sociedade colonial dos fins da década de 40. Mensagem é o nome da revista desse movimento onde estiveram concentrados os expoentes máximos da intelectualidade daquela época, que jogou um papel decisivo perante a História de Angola. Ester blog recupera do passado esse legado e essa designação da Mensagem, na crença de que, ao descobrir Angola, também se vai reencontrando a África e descobrindo o Mundo e o Universo.


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Premência da oralitura no fomento da leitura

Feira do livro
Feira do livro Imagens: DR

José Luís Mendonça

Publicado às 22h00 17/01/2025

O QUE NÃO OUVE O QUE LHE DIZEM E
O QUE LHE LEVAM E NÃO LHE POISAM

O Que Não Ouve o Que Lhe Dizem e O Que Lhe Levam e Não Lhe Poisam encontraram-se num determinado caminho. Eles não se conheciam. Por ironia do destino iam para a mesma aldeia. Quando se cruzaram saudaram-se:
– Bom dia!
– Bom dia, sim! Como te chamas? – Perguntou o Que Lhe Levam e Não Lhe Poisam.
O outro respondeu-lhe:
– Eu chamo-me O Que Não Ouve o Que Lhe Dizem. E tu?
O outro respondeu-lhe também:
– O meu nome é O Que Lhe Levam e Não Lhe Poisam.

Os dois começaram a andar, começaram a andar, começaram a andar. O Que Lhe Levam e Não Lhe Poisam apanhou uma doença. Ele disse para o companheiro:
– Estou doente. Não consigo andar. Desta forma, o que faremos?
O Que Não Ouve o Que Lhe Dizem disse:
– Vem para eu te pôr nas costas.
Quando foi posto nas costas, os corpos de ambos se colaram, mas O Que Não Ouve o Que Lhe Dizem não deu conta do sucedido.

Quando chegaram à aldeia, saudaram as pessoas que lá estavam, e deram-lhes bancos para sentarem. O Que Não Ouve o Que Lhe Dizem disse:
– Desce já para sentarmos.
O Que Lhe Levam e Não Lhe Poisam respondeu:
– Não ouviste o que te disse? Se me levares, não podes mais me poisar.
Os dois amigos começaram então a discutir, por causa dessa situação.

O soba Kimaku, ao deparar-se com essa situação, convocou todo o mundo para resolver o problema. O soba perguntou a todos:
– Esse é O Que Não Ouve o Que Lhe Dizem e este é O Que Lhe Levam e Não Lhe Poisam. Os seus corpos colaram-se, porque um levou o outro que estava doente. Neste caso, o que vamos fazer para separá-los?
Os mais velhos analisaram friamente a situação e concluíram:
– Vamos deixá-los viver deste jeito, porque não conseguiremos separá-los, por causa dos significados dos seus nomes. E os dois amigos viveram assim para sempre, por causa dos seus nomes.

Desta pequena, mas engraçada estória podemos extrair uma grande lição para a vida: os significados dos nomes de cada pessoa. O nome contém uma aura que veicula e vinca o destino de cada pessoa. Dentro dessa aura mágica, situa-se a energia bio-cultural da identidade.

Quem conhecer a estória O Que Não Ouve o Que Lhe Dizem e O Que Lhe Levam e Não Lhe Poisam desde pequeno vai interiorizar esta necessidade de criar uma relação de alma com a sua terra, de ter um nome que o identifique a nível internacional.

As esórias da Oratura angolana são elementos importantes para o enriquecimento de vários aspectos da Cultura-geral e formam uma componente fundamental da cidadania africana.

Segundo o filósofo maliano Amadou HampatéBâ, “A tradição oral é a grande escola da vida, e dela recupera e relaciona todos os aspectos. Fundada na iniciação e na experiência, a tradição oral conduz o homem à sua totalidade e, em virtude disso, pode-se dizer que contribuiu para criar um tipo de homem particular, para esculpir a alma africana.”

Da Oratura à Oralitura

O termo oralitura, cunhado pelo haitiano Ernst Mirville e usado pela primeira vezem 1974, surge como um neologismo que destina um espaço específico para a literaturaoral, sem se confundir com a mesma.Segundo Mekisono, para os escritores da Martinica a passagem da oralidade paraa oralitura é a passagem da memória a curto termo à memória interindividual a longotermo.

Aadopção do termo para mencionar a Oratura transcrita em língua portuguesa para o papel advém da premência da formação do vício da leitura. O que nós pretendemos com esta proposta sobre a Premência da Oralitura no Fomento da Leitura é tão simplesmente fazer um desvio estratégico à morosidade, ao marasmo com que, desde que o Executivo angolano, estabeleceu, a 24 de Maio de 2011, através do Decreto Presidencial n.º 105/11, as linhas gerais da Política Nacional do Livro e da Promoção da Leitura.

Só neste ano de 2024, a 8 de Novembro, isto é, 13 anos depois do Decreto Presidencial n.º 105/11, é que sai o Decreto Presidencial com o nº 247/24, que aprova o Plano Nacional de Leitura 2024/2027. E depois desta aprovação? Quando será então implementado o Plano Nacional de Leitura?

Clubes de Leitores Infanto-Juvenis

Propõe-se o incentivo à leitura com recurso à Oralitura, isto é, o que já se propagou pela língua original das ex-etno-nações, agora trasladado para a escrita em língua portuguesa.

Essa estratégia visa simplificar o processo de leitura das nossas crianças e jovens, nos bairros, na baixa da cidade, nos quimbos, escolas, etc., num país sem livros disponíveis e sem uma acção prática para o ensino e promoção das línguas de origem africana.

A leitura é o indicador mais relevante de um país civilizado. Sendo que a recepção da Literatura pela mente humana recria uma cátedra de raciocínio auto e hetero-dialógico com uma dupla sequência pedagógica – de ferramenta de afinação linguística a distensor de consciência humanista – apontam-se caminhos para o efectivo uso da Oralitura como factor criativo da Arte de Bem Falar e Bem Fazer Angola, através da criação de Clubes de Leitores Infanto-Juvenis.

Objectivos e Princípios reitores

O objectivo geral da criação de Clubes de Leitores Infanto-juvenis, baseados na ampla consagração da Oralitura é desenvolver as capacidades de aprendizagem e de comunicação social colectiva e inter-subjectiva na língua oficial da República de Angola.

Um princípio reitor é o da auto-suficiência na reprodução das estórias policopiadas, através da constituição de um fundo literário próprio em cada pólo, com contribuições voluntárias dos próprios participantes, dos escritores transformados em Mecenas do fomento de leitura.

Para além do princípio da auto-suficiência, anunciado atrás, esta estratégia também é regida pelo princípio da simplicidade, segundo o qual, uma única estória pode bastar, para desencadear a leitura, sem mais delongas e assim promover a literacia.

Uma única página impressa ou policopiada poderá servir de incentivo ao gosto pela leitura, tanto pelo baixíssimo custo de produção, quanto pela gratuitidade da sua recepção. Esta página conterá apenas uma estória tradicional.

A prática da leitura no seio das comunidades deve ter, como primeiro destinatário, a infância e a juventude.

Constituição do Clube de Leitores Infanto-Juvenis

Cada clube é composto por 20 leitores com idades compreendidas entre os 8 e os 18 anos de idade.

O clube é coordenado por um Motivador da Leitura, um jovem com garra, que goste de ler e motivar os seus pares a ler. Estes motivadores podem partir dos movimentos literários.

O clube é formado pelo princípio da proximidade: vizinhos do jovem Motivador, para não ter de percorrer distâncias que exigem transporte motorizado.

Nesta versão, o motivador socorre-se de 21 cópias de cada estória, sendo uma para ele.

Metodologia

O Motivador deve identificar no bairro ou na sua rua um lugar propício à reunião do grupo. Pode ser à sombra de uma árvore, no quintal de uma casa, no recinto de uma igreja, numa escola, etc.

O Motivador convoca os vizinhos e distribui a cada um deles um exemplar da estória.

A estória é lida em voz alta pelo Motivador enquanto o grupo acompanha a leitura em silêncio.

De seguida, o Motivador pergunta se alguém se deparou com alguma palavra cujo significado não percebeu.
Esclarecido o significado, o clube de leitores procurará, de forma organizada e disciplinada, falando um de cada vez, esmiuçar a moral da estória.

Por último, pede-se a algum dos leitores que resuma o conteúdo da estória em apenas um parágrafo.

Cada um leva o seu exemplar para casa e o Motivador propõe que criem encenações, desenhos simples ou em banda desenhada e que decorem a estória, para a dizerem sem a ler no próximo encontro, dentro de 15 dias.

Quando todos os integrantes do Clube de Leitores conseguirem dizer a estória de cor (sem a ler), passa-se à etapa seguinte, com a introdução de nova estória.

Edição da Oralitura

Ao concluir a primeira ronda de Oralitura (10 contos, 20 provérbios e 20 adivinhas) serão os textos agrupados nessa ordem e publicados numa pequena brochura. Esse será o caderno de Oralitura número 1.

Poder-se-á enquadrar esses cadernos na ColecçãoMulembaxangola de Oralitura Angolana. Esta pretensão só será exequível na condição de haver um ou vários Mecenas que contribuam financeiramente para a sua edição.

Entretanto, o processo de leitura continua na modalidade inicial, com o recurso a cópias de uma página de Oralitura.

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