SERENATA AO MUSSEQUE


Mensagem inicia a publicação de poesia angolana, promovendo novos autores e relembrando o canto áureo de autores já consagrados.
A abrir, apresentamos o poema Serenata ao Musseque, de Muanawassa (pseudónimo literário da jornalista Kina dos Santos).
Um poema que nos faz olhar para uma zona de Luanda há muito versejada por grandes poetas, como Agostinho Neto, ou narrada nos contos de Luandino Vieira.
Poema de Muanawassa
SERENATA AO MUSSEQUE
No musseque,
Entre as casas de latas e o chão arenoso, há poesia da natureza no dia a dia.
Há orvalho no amanhecer
Há orgulho no entardecer
No musseque há ginga nos corpos e na vida
Há uma Minga com muitos monas e fome na barriga.
Há vontade
Há saudade
Há maldade
No musseque suamos
Dançamos
Matamos
E vivemos.
Musseque tem história
Não há glória
Mas cantamos as vitórias
Do dia sobre o dia.
No musseque é assim
Verdades sem fim
Na mentira do nosso existir
Já sem o frenesim dos poetas da minha história.
Oh musseque!
Tua gente é gente
Teme, luta, vence, reluta, perde e se deixa perder no trago da fumaça secreta.
Meu musseque,
Dos altos e baixos
das andanças estão os calos das lembranças
Meu musseque
Sorriso no improviso
Da vida
Só musseque, sem farinha
Da mandioca raivosa
Saída do chão vermelho sangrado.
Musseque
Maboque duro e adocicado
Dos maboques pendurados nos peitos das kilumbas novas que tremem a cada passo firme.
Musseque
Preto de pretos de todos os tons e com todos os sons
Musseque
Da corrida e da partida da lida da Guida que grita no grito do tambor do peito dela.
É o pregão da sobrevivência com muxoxo
Pro Gastão que lhe açoitou as costas.
Só no musseque
Vivi e resisti
Curti e faleci
Para as falácias do mundo
Sakidila musseque.